A tarde estava cinzenta e a chuva caía em gotas grossas e violentas. A humidade, suspensa no ar, convidava ao encerramento de portas e janelas. Para além da estrada, a terra saturada de água, transformara os caminhos de terra
Subitamente uma voz arrancou Inês ao mundo dos pensamentos e da contemplação.
- Inês, vamos buscar os manos à escola! – gritava a mãe do fundo da escada.
A pequena sobressaltou-se.
- Já vou, mãe! – respondeu na sua voz doce e fina de criança.
- Veste o casaco! – aconselhou-a a mãe.
- Está bem, mãe! – respondeu a pequena cujos passos se dirigiam ao quarto, para cumprir a ordem maternal.
Rapidamente os pés de Inês surgiram na escada, saltitando nas suas botas vermelhas de nabuco. No braço direito, descansava um casaco cor-de-rosa cujo capucho balançava ao compasso dos passos da pequena.
A mãe ajudou a pequena a vestir o casaco e a apertar o fecho. Pegaram nos chapéus-de-chuva e dirigiram-se ao estreito portão pesado, previamente aberto. Meteram-se as duas na carrinha, abandonando a urbanização, rumo ao liceu onde os dois irmãos de Inês esperavam pacientemente a sua chegada. Ao fundo da sua rua, a carrinha voltou à esquerda. Inês, encostada no leve banco com cinto à volta do seu corpo, observava a paisagem que desfilava diante dos seus olhos. Subitamente, puxou o corpo ligeiramente para a frente, alargando o cinto de segurança com a mão, para observar melhor o céu. Que era aquilo? Inês esfregou os olhos para ter a certeza de que estava a ver bem. No céu cinzento desenhava-se um arco multicolor que começava num ponto da terra para terminar noutro desconhecido. Que lindo! O arco parecia brilhar em todo o seu esplendor, reflectindo as suas cores em todas as direcções. Inês estava encantada com tanta beleza. Ficou calada por momentos, observando o arco em toda a sua magnificência.
Quando a curiosidade se tornou mais forte que a contemplação, Inês apontou na direcção do estranho arco:
- Mãe, o que é aquilo, ali, no céu? – perguntou a pequena.
A mãe desviou, por momentos, a sua atenção da estrada e, pelo espelho retrovisor, procurando a direcção em que a filha mais nova apontava. À sua frente, desenhava-se um elegante arco multicolor, resplandecente nas suas coloridas vestes.
A mãe sorriu.
- É um arco-íris, Inês! – explicou-lhe. – Sempre que chove, o ar fica molhado o que faz com que o sol nos dê este espectáculo, cheio de cor e luz. Sabes, é como se o sol, nos quisesse mostrar que ele não se esqueceu de nós e que está lá. Foi ele que desenhou aquele elegante arco colorido e brilhante com os seus raios. Já viste as cores?
- São tantas, mãe! – respondeu a pequena fitando o arco maravilhada.
A mãe sorriu.
- O arco tem sete cores: vermelho, laranja, amarelo, verde, azul, anil (ou índigo) e violeta.
- Ele vai ficar sempre ali? – perguntou a garota esperançada.
- Não, ele vai desaparecer assim que o ar secar… - respondeu cautelosamente a mãe. – Mas, sempre que chover, o sol vai presentear-nos sempre com outro…
Inês ficou a observar aquele elegante arco tão puro e brilhante, vibrando nas suas cores tão vivas. Na viagem de regresso, ela chamou a atenção dos irmãos que, calados por momentos, admiravam a belíssima escultura de luz, elegantemente erguida no céu escuro.
Em casa, Inês despiu rapidamente o casaco e dirigiu-se ao quarto. Passados instantes, voltou a descer segurando uma folha branca na mão.
- Olha, mãe! – exibiu orgulhosamente a pequena.
No meio da folha, destacando-se de um fundo cinzento, um lindo arco-íris elevava-se na folha resplandecente iluminando os olhos de quem o apreciava.
- Este não desaparece, mãe… - assegurou a pequena sonhadoramente.
(Aos meus jovens leitores, sobretudo aos de S. Tomé e Príncipe, onde parece haver inúmeros... Abraço!)
Inês andava intrigada. Olhava para todos os lados e não compreendia. O que era aquilo? Era tão forte que até quase não a deixava abrir os olhos. Por mais que se voltasse, ela encontrava-se em todo o lado, inundando toda a paisagem de uma força incrível, e dando-lhe um aspecto mágico e acolhedor. Era aquela luz que lhe aquecia a cabeça nos dias de maior calor, e lhe dava a oportunidade de brincar calmamente, fora de casa, à sombra.
- Que luz era aquela? – interrogava-se a pequena.
Os brinquedos inanimados a seu lado, esperavam pacientemente pela atenção da dona, que parecia profundamente distraída com algo que eles desconheciam. Também eles estavam admirados, mas o seu espanto devia-se à incompreensão da atitude da pequena, que abandonara subitamente a brincadeira onde havia estado imersa, durante uns profundos longos minutos. Permaneciam parados olhando na direcção do céu, onde algo captava a atenção da pequenita, que se limitava a mudar de posição, como o girassol, continuando a olhar para os lados e para cima. Chegou mesmo a levantar-se e a esquadrinhar o jardim da casa, seguindo um raciocínio que ela não partilhava com ninguém. Alguns bonecos olhavam incrédulos o céu, para onde ela os deixara virados, quando se havia decidido a parar a brincadeira. Não sabiam o que se passava. Ela não se aborrecera da brincadeira, eles não a haviam incomodado com nada. O que se passaria? Ela parecia agora ter iniciado uma brincadeira que outros, os que se encontravam encostados à parede, não compreendiam. Ela parecia executar uma dança estranha, sempre atenta a algo que eles não compreendiam o que era. Mantinham-se parados, estupefactos, olhando aquela estranha dança que parecia não ter fim. Mesmo eles pareciam atraídos pelos movimentos enigmáticos da gaiata, não conseguindo desviar os olhos dela. O que estaria ela a fazer? O que lhe prendia tanto a atenção a ponto de esquecer os seus amiguinhos? Ao princípio, eles haviam ficado um pouco contrariados, tinham que admitir, tal era o entusiasmo da brincadeira mas, depois, haviam-se limitado a ficar ali, presos àquela nova e inesperada brincadeira inventada pela miúda.
Subitamente, ela abandonou o pátio onde brincava e dirigiu-se a casa. Chamou a mãe e regressou com ela pela mão. Sentaram-se as duas nos degraus que conduziam à porta de entrada, do lado da casa que dava para a rua. Inês levantou o braço e indicou a paisagem ao redor. Levantou-se e tomou várias posições no jardim.
- Vês? – questionava a miúda, intrigada. – Para onde quer que eu vá, ele está sempre em cima de mim! Só aqui é que não! – continuava ela enquanto se refugiava na exígua faixa desenhada pela sombra da casa. – O que é esta luz? Por que é que ela me persegue, para onde quer que eu vá? Vês, se eu ponho o pé de fora, ela apanha-me logo!
A mãe sorriu, o que intrigou ainda mais os bonecos. Ela parecia divertida com aquela estranha situação! Raramente eles a viam reagir assim quando a filha brincava com eles! Teria a pequena descoberto uma nova brincadeira que a faria esquecer-se deles? Não bastavam as flores que, de vez em quando, a distraíam da brincadeira que tinha com eles? Eles não sabiam explicar. Mantinham-se atentos às reacções das duas.
- Inês, a luz que tu vês é a do sol. – começou a mãe, percebendo a ideia da filha mais nova. – Ele é uma bola muito grande de fogo, que está muito longe. Ele tem uma responsabilidade muito grande para connosco. É ele o responsável pela vida na terra.
A pequena escutava a explicação da mãe, enquanto caminhava lentamente na sua direcção. A pequena abanou a cabeça em sinal de incompreensão. Percebera só que ele era muito importante.
- Imagina esta bola grande de fogo. Essa bola, chamada sol, impede-nos que morramos de frio no Inverno. Sabes, aquela estação onde reina o frio. É ela também que faz com que os dias tenham luz, evitando que andemos às escuras…
- Como acontece quando ele se vai deitar, à noite? - perguntou a menina.
- Muito bem. É isso mesmo. – respondeu a mãe entusiasticamente. – Imagina como seria a vida se a nossa casa estivesse sempre imersa na escuridão da noite, convivendo só com a fria e distante luz das estrelas. Sem a claridade das manhãs soalheiras… ou mesmo a claridade que nos acompanha, sempre que o céu se cobre de nuvens negras… imaginas como seria triste a nossa existência? Não haveria flores, árvores… nada seria como é. Nem nós seríamos como somos! Tu gostas da praia, sabes que o sol aquece o ar para nós irmos à praia no verão? Se não fosse ele, nós não poderíamos tomar banho, pois estaria sempre muito frio!
A pequena ficou calada por alguns momentos. A mãe observava-a pacientemente. Parecia ter compreendido.
- Eu não gostaria de viver num sítio onde fosse sempre noite ou fizesse sempre frio. – concluiu ela. – Seria muito triste. Eu gosto do sol. Não me importo de usar chapéu. Já percebi que ele é um amigo e que está no céu para nos ajudar. Eu gosto do sol!
Inês pegou nos bonecos, deitados a seu lado, e recomeçou a brincadeira, para grande alívio destes.
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